Cinefilia 16: O Cinema Novo de Glauber

sexta-feira, 2 de setembro de 2011
Postado por Selton Dutra Zen


Glauber Rocha. O diretor mais controverso e polêmico do Brasil. Alcançou este destaque por dirigir filmes esdrúxulos, fora dos parâmetros do cinema brasileiro da época. Foi o principal, e na minha opinião, o melhor representante do Cinema Novo brasileiro, movimento cinematográfico que, basicamente, resgatava o Neo-realismo italiano, com sua crueza, ao passo que realizava fortes críticas ao governo da época. Tudo isto com um toque especial de filmes de arte! Glauber dedicou sua carreira à este movimento, o aprimorou e o evoluiu. Sendo assim, generalizo dizendo que, se uma pessoa não gosta de Glauber, não gosta do Cinema Novo!

Sim, adoro este diretor bahiano, não por estar em voga ultimamente, como algumas pessoas justificam, mas sim por considerar excelente a maior parte de seus filmes, por reconhecer e entender o Cinema Novo e, pessoalmente, por gostar do clima e do caráter revolucionário de suas obras. Seus filmes são tecnicamente surpreendentes! Os cortes absurdos, porém geniais, para a década de 60 (mesmo a Nouvelle Vague já tendo popularizado esse tipo de edição) são de cair o queixo! Seus roteiros condensavam perfeitamente tradição local, religião e política, de forma sem igual, sem cair no artificial ou falso moralismo! Sua fotografia que quase sempre optava pela câmera na mão, era eficaz, por conseguir acrescentar mais veracidade à trama. Todavia, tenho que reconhecer que Glauber Rocha está longe de ser um diretor impecável! Em alguns momentos se torna transparente para o espectador que Rocha se deixava levar pela sensação do momento e se focava excessivamente na técnica do filme e esquecia de uma outra parte importantíssima da obra: os atores. Em quase todos os seus filmes, os atores possuem desempenhos pavorosos, beirando ao cômico! E não me venham dizer que as atuações exageradas e artificias eram propositais, pois existe uma enorme diferença entre proposital e desproposital, uma diferença visível, e nas produções deste diretor, infelizmente, as interpretações horrendas não são propositais! Para lhes apresentar minha opinião em um parâmetro geral, irei analisar algumas de suas obras separadamente.

Em 1964, Glauber lançou "Deus e o Diabo na Terra do Sol", que considero o melhor filme brasileiro que já tive o prazer de assistir em toda a minha vida! TUDO, em letras garrafais, TUDO (com exceção dos atores) é excelente e se une de forma magistral para compor esta que considero ser a maior obra-prima do cinema brasileiro! Destaque, entre todos os elementos fabulosos, ao roteiro, edição, direção e trilha sonora. Esta última é usada de forma inteligente por Glauber para expor pontos da trama, apresentar personagens e para personificar o alter-ego do personagem principal. A importância de "Deus e o Diabo na Terra do Sol" é imensurável. Este foi o primeiro filme responsável por conceder fama ao diretor, além de nos apresentar à figura de Antônio das Mortes (o vilão desta produção), que mais tarde, em 1969, voltaria às telas.

Mas foi somente em "Terra em Transe", de 1967, que o Cinema Novo alcançou seu ápice dentro da carreira do diretor nordestino. As caraterísticas deste movimento aqui, são muito mais gritantes e explícitas, chegando ao ponto de serem adicionadas cenas aparentemente sem elo algum com a história, para somente ao final, ficarmos a par do porquê delas existirem. Aqui, a crítica ao governo é a mais escrachada possível, basta observarmos a trama, que aborda a política brasileira, sua podridão e suas consequências. E, apesar de isto ser extremamente escancarado ao espectador, em nenhum momento soa forçado ou piegas. Destaque novamente à edição, à direção e à fotografia.

"O Dragão da Maldade Contra o Santo Guerreiro", lançado em 1969, serviu como uma espécie de continuação de "Deus e o Diabo na Terra do Sol", ao resgatar o personagem de Antônio das Mortes, nos possibilitando ver o outro lado da moeda. Se no filme de 64 o tínhamos como vilão, aqui, em "O Dragão da Maldade..." vemos o seu lado mais humano, sensível e heróico. Ótima trucagem de Glauber Rocha, pois permite uma maior desconstrução deste personagem. Neste filme, o destaque continua sendo para a edição, direção e trilha sonora, onde algumas músicas são resgatadas de "Deus e o Diabo...". Porém, o roteiro deixa um pouco a desejar, não afetando de forma muito significativa a qualidade deste filme, que por sua vez, é excelente!

Como disse no segundo parágrafo, considero quase todos os filmes do diretor em questão excelentes, com algumas exceções, como o curta-metragem, "Di Cavalcanti Di Glauber", de 1977, que foi lançado como uma homenagem ao pintor Di Cavalcanti, muito amigo do cineasta, porém se revela um curta desnecessário. Poderia permanecer no acervo particular do próprio diretor, somente como uma recordação pessoal de seu amigo. Desta vez, destaca-se somente a edição e fotografia. A trilha sonora é incompatível com o seu conteúdo e a direção é errônea. Bem mediano!

Enfim, você pode gostar ou não de Glauber Rocha, mas deve reconhecer que ele foi um diretor inventivo, revolucionário (positiva ou negativamente - dependendo de seu ponto de vista) e, acima de tudo, um homem preocupado com a nação brasileira. Até o próximo post!

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