308. Capitalismo - Uma História de Amor

domingo, 27 de março de 2011
Postado por Selton Dutra Zen 1 comentários

Michael Moore é um dos documentaristas mais influentes da atualidade (se não o mais influente). Ele possui um jeito único de documentar. Seus filmes possuem algumas características marcantes, como a ironia, que é uma constante nos filme de Moore, mas claro sem exageros, simplesmente uns alívios cômicos de humor negro que dão um diferencial as suas produções. Além da ironia, seus documentários independentes possuem a medida certa de drama e informação, não os deixando maçantes e melodramáticos demais. E um dos temas mais explorados por Moore ao longo de sua carreira é o governo americano e o modo com que age e prejudica os cidadãos. Então, "Capitalismo - Uma História de Amor" acaba se tornando um prato cheio para Michael, por abordar o lado B do sistema capitalista promovido pelo governo norte americano como a solução dos problemas de todos e a transição para uma vida longe de pobreza. Este mais novo longa do cineasta traz muitas referências ao primeiro filme do mesmo: "Roger e Eu". Além de rediscutir tópicos de "Roger e Eu", Moore constantemente insere imagens e o comenta. Como de praxe, a temática do filme é explorada a fundo e dela surgem mais uma dúzia de incógnitas que ao longo da projeção serão discutidas e não necessariamente respondidas. Será que o capitalismo é tão bom assim? Será que ele favorece a todos? Porque constantemente pessoas são despejadas de suas casas nos E.U.A? Porque os ricos ficam mais ricos e os pobres mais pobres? Porque empresas são obrigadas a fechar e deixar milhares de pessoas desempregadas? Porque jovens são presos sem necessidades e levados à um centro de reabilitação "modelo" para jovens? Tudo isto é concluído com um final magnífico, como é costumeiro de Moore. "Capitalismo - Uma História de Amor" é um soco na cara de qualquer norte americano, como qualquer outro filme do genial Michael Moore! E levando em conta que vivemos em um país capitalista, não deixa de ser um soco na nossa cara também!

(Muito bom)

Gênero: Documentário
Duração: 127 min.
Ano: 2009

307. Lixo Extraordinário

terça-feira, 15 de março de 2011
Postado por Selton Dutra Zen 0 comentários

Uma coincidência interessante é que dois dos cinco filmes indicados ao Oscar de melhor documentário, documentavam a trajetória ou as obras de artistas plásticos. "Exit Through the Gift Shop" tratava do artista Banksy e sua street art, "Lixo Extraordinário" trata do artista Vik Muniz, brasileiro, que cria suas obras a partir de materiais nada convencionais, no caso aqui, a partir do lixo. Esta co-produção brasileira, em parceria com a Inglaterra (não, o filme não é somente brasileiro), expõe o processo de criação de vários quadros a partir do lixo, retirado do lixão Jardim Gramacho, que é considerado um dos maiores aterros sanitários do mundo, desde a fase de seleção do lixo que será utilizado nas obras, até o envolvimento com os catadores de lixo. E é com foco neles que o filme se segue e emociona. É triste vermos pessoas da favela desesperadas, que tem como única opção trabalhar no lixo. E além de acompanharmos o sofrimento diário destas pessoas, ainda somos deparados com o passado muitas vezes sombrio das mesmas. Através de entrevistas, ouvimos as histórias de como era a vida delas antes do lixão. Muitos relatos emocionam, como o de Isis Rodrigues que, com muita dor relembra quando seu filho de 3 anos morreu de pneumonia. Triste também constatar que os próprios catadores se menosprezam. Em certo momento do filme, quando Vik Muniz e a equipe de gravação do filme vão ao lixão, alguém grita do meio do lixo: "Tão filmando pro Mundo Animal!". Além de tudo, "Lixo Extraordinário" é um documentário muito bem fotografado e editado, basta notar as cenas aéreas do Jardim Gramacho. Este é um filme essencial para qualquer brasileiro, pena que ficará somente ocupando lugar em prateleira de locadoras, ou no máximo será transformado em material didático, mas infelizmente é pouco provável que ele vá se popularizar entre os cidadãos, mesmo tendo concorrido ao Oscar. Em outro momento da projeção, Isis Rodrigues fala: "Em casa, você simplesmente joga o lixo no lixo, mas pra onde vai este lixo?". Pense nisso.

(Muito bom)

Gênero: Documentário
Duração: 94 min.
Ano: 2010

Cinefilia 12: Clássicos: Dogville

domingo, 13 de março de 2011
Postado por Selton Dutra Zen 2 comentários

Obs: Este post contém spoilers!


"Dogville" é um filme essencial para estudantes de psicologia ou sociologia, porque além de promover uma análise acerca das atitudes sociais humanas, Lars Von Trier ainda testa os nossos próprios sentimentos em uma conclusão absurdamente chocante.

Grace (Nicole Kidman) é uma mulher que acaba parando em uma cidadezinha, com pouco mais de cinco estabelecimentos, chamada Dogville, enquanto fugia de gângsters. Os moradores de Dogville a recebem calorosamente e a deixam ficar o tempo que precisar, mas em troca Grace precisa trabalhar para eles. De início, sua carga horária é tranquila, e ela recebe um salário razoável, mas com o passar do tempo, os moradores da cidadezinha vão mostrando suas garras e transformam Grace em uma escrava.

O que se segue é uma cena mais angustiante que a outra. Vemos a personagem principal ser maltratada, estuprada, xingada e trapaceada. Notem que, nas primeiras vezes em que Grace é estuprada por um dos moradores de Dogville, ela se desespera e se debate, mas nas outras muitas vezes que se seguem (um estupro ocorria quase que diariamente) ela está conformada e mesmo enojada de ver um homem sujo e vil se apossando de seu corpo, não se debate mais, fica parada, conformada, porque ela sabe que se protestar ou se rebelar a corda arrebentará no lado mais fraco, que no caso é o dela.

Uma das vezes em que ela é estuprada, a esposa do homem que a estuprou (junto de algumas outras mulheres da vila) vão ao lugar onde Grace dorme e a torturam psicologicamente, como se quem tivesse se oferecido para ter relações sexuais com o marido dela fosse Grace. E ao final desta cena, a mulher ainda continua torturando-a, mas desta vez tendo como objeto de tortura bonecas que Grace, com tanto esforço conseguiu comprar na loja da região.

E no terceiro ato do filme, os personagens chegam ao ponto de amarrar uma coleira de metal presa a uma roda de carroça, também de metal, com um sino, em seu pescoço para ela não fugir e continuar servindo de escrava doméstica e sexual da vila. Como um animal. Aliás, um animal seria melhor tratado em Dogville do que Grace.

Quando "Dogville" chega em seus 15 minutos finais, já estamos completamente indignados com a situação pela qual a pobre personagem central está sendo submetida, temos vontade de entrar na tela e providenciar um bom castigo a todos os moradores. Somos surpreendidos então, com a notícia de que os gângsters dos quais Grace estava fugindo são liderados por seu pai, que estava apenas tentando traze-la de volta para casa. Grace não suportava sua casa, mas com certeza seria melhor do que aquele local. Na verdade poucas coisas podiam ser piores do que a sua situação atual. E com determinação impõe uma condição para que volte para casa: que os membros da máfia de seu pai matassem todos que residiam em Dogville. Assim sendo, Von Trier encerra o filme com a imagem de uma chacina contra todos os moradores da vila. Nesta sequência final, presenciamos homens matando todos, até um bebê, quase um recém nascido, no colo de sua mãe.

Neste momento Lars Von Trier, após promover uma discussão sobre as capacidades sociais do ser humano, nos faz julgar nossos próprios sentimentos. Confesso que fiquei realizado em ver todas aquelas pessoas sendo castigadas por tudo o que fizeram com Grace, mesmo que este castigo tenha sido a morte. Mas depois que a cena acaba, quando os créditos sobem, esta realização da lugar a um sentimento de culpa. Culpa por gostar de ter visto pessoas morrendo, tudo bem que aquelas pessoas mereciam, mas será que o bebê no colo de uma mulher má merecia morrer de forma tão brutal? Não, não merecia. "Dogville" nos força a fazer uma auto-reflexão. É natural do ser humano gostar de ver catástrofes, embora apenas com pessoas que mereçam, não com inocentes. Mas será que estas pessoas mereciam a morte?


Este filme merece ser assistido não somente por seu roteiro genial, mas também por uma parte técnica inovadora e ao mesmo tempo muito ousada. Lars Von Trier ousa criar um filme de quase 3 horas que se passa completamente em uma pequena cidadezinha, onde as construções não possuem parede, nem portas, apenas divisões marcadas por linhas brancas no chão. Quando um personagem entra em um estabelecimento, ele abre uma porta imaginária e podemos ouvir o som da porta abrindo e fechando. Para alguns esta técnica pode soar enjoativa, mas para mim, soou ao contrário, genial! Magistral! Estas quase 3 horas passaram como se fossem 90 minutos!

Os méritos não param por ai! Von Trier consegue extrair de Nicole Kidman uma interpretação visceral, digna de Oscar, onde ela conegue representar brilhantemente bem a transição de sentimentos e expressões pelas quais sua personagem passa.

Sendo assim, "Dogville" é um filme essencial para sociólogos e psicólogos, mas principalmente, é um filme essencial para qualquer cinéfilo. "Dogville" é um dos melhores e mais originais filmes da história do cinema!

306. O Mágico

segunda-feira, 7 de março de 2011
Postado por Selton Dutra Zen 2 comentários

Lembro-me que, durante a minha infância, assistia incessavelmente, várias vezes consecutivas, a animação "101 Dálmatas". Até hoje me recordo dos bons momentos que passei assistindo-a. E hoje, depois de muitos anos, assisti "O Mágico" e me emocionei muito, pois esta animação francesa lembra absurdamente "101 Dálmatas", bem como outras antigas animações, em sua estética. Não só por isso me emocionei e me encantei com esta produção, mas também por ela ser tão sensível e tocante ao retratar a convivência de uma garota e um homem que não falam a mesma língua, ao mesmo tempo que narra a busca para salvar uma carreira que há muito tempo já havia sido esquecida. Criado a partir de um roteiro de Jacques Tati, aliás, o filme homenageia o comediante em uma cena genial, onde o personagem título se depara com um cinema apresentando "Meu Tio", de Tati e, quando entra na sala onde o filme está sendo exibido, leva um choque ao ver que o ator do filme possui exatamente o mesmo jeito dele, ou seja, o personagem do mágico é uma grande homenagem ao próprio Jacques Tati, "O Mágico" narra a dramática história de um ilusionista que procura desesperadamente um lugar para se apresentar, pois ninguém mais quer assistir um mágico e sua carreira está condenada. Em uma de suas viagens, ele encontra uma garotinha que decide viajar com ele. Os dois não falam a mesma língua, mas um elo muito forte surgirá entre os dois. Ao meu ver, o personagem do mágico é uma metáfora ao próprio filme, onde animações desenhadas estão dando lugar às animações computadorizadas, uma vez que este é um filme desenhado, não computadorizado. O mais impressionante é que este filme possui pouquíssimos diálogos. Se juntarmos todas as cenas faladas, teremos no máximo 3 ou 4 minutos! Mas ainda assim, o filme emociona de uma maneira impressionante. Ao melhor estilo Chaplin. Os personagens, como em filmes mudos, se expressam, conversam e se comunicam através de gestos e expressões, quase nunca por palavras. Assim, "O Mágico" acaba se tornando uma das melhores e mais emocionantes animações que vi em toda a minha vida, ficando somente atrás de "Wall - E"! Lindo, alegre e triste, bucólico e sofisticado, em singelos 80 minutos, consegue cumprir maravilhosamente bem o que promete.

(Obra-prima)

Gênero: Animação
Duração: 80 min.
Ano: 2010