336. Pão Negro

sábado, 31 de dezembro de 2011
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(Mediano)

Ao contrário do que escrevi em minha crítica de "Missão Madrinha de Casamento", "Pão Negro", possível concorrente a estatueta de melhor filme estrangeiro no Oscar 2012 (representando a Espanha, por obséquio), possui uma trama promissora, mas que é desperdiçada por algo desfocado, sem ritmo e desinteressante.

Após créditos iniciais obscuros e remetentes a contos de fada (estes que, de certa forma, farão parte da película), somos apresentados a uma cidadezinha que vê seu cotidiano mudado com a repressão da guerra e de dois assassinatos locais. Rapidamente, um homem humilde é sentenciado como culpado por tal crime e vai para a cadeia. Seu filho, então, parte em busca de uma solução para o mistério acerca das mortes, ao passo que vai amadurecendo gradativamente. E é justamente aí que se encontra o erro principal desta produção espanhola. Durante toda a projeção, o filme aborda duas linhas narrativas: a do garoto descobrindo a adolescência e o início da vida adulta e a investigação do mesmo acerca dos homicídios. E isto poderia render um filme e tanto se o roteiro possuísse mais cuidado ao abordar estes dois temas. Porém, infelizmente, isso não acontece. Assim, ao invés de completar e acrescentar profundidade ao filme, as duas linhas se misturam em uma miscelânea completamente errônea, onde nenhuma das duas partes são exploradas como deveriam ser, nem completadas corretamente. São duas abordagens vagas, superficiais e equivocadas acerca de um personagem que poderia se tornar muito complexo. Consequentemente, quando o garoto interage com a sua "amiga" (leia-se, amizade colorida) ou até mesmo com suas tendências homossexuais para com o rapaz agricultor, as mesmas não são críveis nem eficazes, já que não somos remetidos o suficiente a estas situações. O mesmo pode-se aplicar à investigação, sem ritmo e, em inúmeros momentos, fatigante. 

Todavia, "Pão Negro" não é de todo ruim, até porque arrecadou três estrelas da minha parte (e não uma), por possuir vários momentos e ideias dignos (as) de respeito, como a inclusão de lendas folclóricas regionais muito bem realizada e acertada e até mesmo o caráter psicopático de algumas crianças da vila, fatores que, juntos, acabam adicionando um certo tom macabro em diversos momentos da projeção, que associados à uma sub-trama falsamente fantasmagórica (no sentido literal da palavra), fazem, mesmo que por alguns segundos, o espectador sentir algo durante o filme, que não seja indiferença. 

As performances de boa parte do elenco, principalmente mirim, também contam como pontos positivos, merecedores de citações por aqui, por serem convincentes e um mínimo críveis. Por outro lado, a direção é fraquíssima, por não conseguir dominar a obra como deveria, entregando um resultado nada satisfatório ao público. Por isso, acho que seria um desperdício de oportunidade se este exemplar fosse realmente indicado à categoria que citei no primeiro parágrafo deste texto, pois, além de não merecer, aborda um tema delicado de uma forma desrespeitosa. 

Gênero: Drama
Duração: 108 min.
Ano: 2010

335. Missão Madrinha de Casamento

quinta-feira, 29 de dezembro de 2011
Postado por Selton Dutra Zen 0 comentários


(Bom)

Confesso que, devido ao título e a plot, conservava um certo preconceito acerca desta obra. A voz da experiência cinematográfica me dizia que esta seria somente mais uma bomba hollywoodiana, enlatada e imbecil. Mas levei um tapa na cara ao me deparar com um filme que está muito longe de ser uma comédia imbecil, bem como uma bomba. E digo mais: esta é, com certeza, uma das comédias mais divertidas e engraçadas do ano! Com gags interessantes e originais, mas acima de tudo, hilárias. É impossível controlar o riso durante os pouco mais de 120 minutos de projeção. 

A história é básica e aparentemente clichê ao extremo, onde temos Lilian, uma grávida prestes a se casar, que convida Annie, sua melhor amiga, para ser sua madrinha de casamento. Annie decide, então, realizar uma despedida de solteira inesquecível para a amiga. Porém, tudo se desenrola de maneira imprevista e prejudicial à madrinha. E, depois de ler isto, você deve estar pensando: "História bem medíocre, hein? Deve ser uma bomba!". E foi exatamente isto que pensei, porém, o grande diferencial deste filme é justamente a assinatura de Judd Apatow na produção, que aplica sua marca registrada (do humor negro e da comédia suja e original)  não só na produção do longa, mas também em sua direção. É impossível, para quem conhece os trabalhos de Judd, desassociá-lo do órgão mor de um filme (o diretor). Inúmeras características presentes em suas películas surgem aqui também, como a duração atipicamente longa para uma comédia atual (porém muito bem aproveitada), o próprio humor que citei acima, e até o âmbito técnico, como provam a edição e a fotografia. Se não fosse por ele, "Missão Madrinha de Casamento" possivelmente se tornaria aquela bomba que previa ser, antes mesmo de vê-lo.

Além da produção excelente, as personagens e suas intérpretes também são atrativos impossíveis de serem ignorados, já que são extremamente divertidas, excêntricas e impagáveis. E, apesar de Annie ser a mais chamativa das personas, as coadjuvantes também não ficam para trás, quando o assunto é diversão. Cada uma com suas respectivas personalidades exóticas, seus trejeitos e suas falas, completam os movimentos de Annie, que por sua vez, é interpretada singularmente por Kristen Wiig. E a performance de Wiig é tão boa que somente observar seus movimentos, suas ações e suas peculiaridades já fariam o filme valer a pena. Todavia, "Missão Madrinha de Casamento", felizmente, vai muito mais além disto, atingindo momentos de extrema hilaridade, como a cena da loja de vestidos, ou a tentativa de Annie de conseguir atenção policial, utilizando-se de seu carro. 

Por estas pontuações e muitas outras que porventura tenha esquecido, é que indico a todos os meus leitores que abdiquem do preconceito empírico e assistam sem receios a este longa que encontra sua essência básica e sua fórmula do sucesso, na participação de Judd Apatow na produção e de Kristen Wiig no elenco. 

Gênero: Comédia
Duração: 130 min.
Ano: 2011

334. A Pele que Habito

quarta-feira, 21 de dezembro de 2011
Postado por Selton Dutra Zen 0 comentários


(Muito bom)

Obs: Este texto contém spoilers!

Considero "A Pele que Habito" um filme revolucionário. Não no sentido narrativo, técnico ou imagético, mas com certeza revolucionário dentro da filmografia de seu diretor, Pedro Almodóvar. Digo isto por notar que suas obras, antes cômicas, estão dando lugar à exemplares com um apelo dramático muito maior e histórias mais densas. Basta notar seu longa longa anterior, "Abraços Partidos", que abandona bastante os toques humorísticos e descontraídos, em detrimento de algo bem mais triste, trágico e "pesado" (se é que pode-se adjetivar assim). E isto chega ao ápice em "La Piel que Habito".

A começar pela trama, atípica e um tanto mórbida, que narra um período da vida de um cirurgião doentio e obcecado, ao manter uma cobaia humana presa em um quarto de sua mansão. E, particularmente, eu considero o roteiro deste filme um dos melhores da cerreira de Almodóvar, ao se revelar sério, objetivo e emocionalmente carregado, logo nos primeiros minutos de projeção. Além disso, desconstrói os personagens centrais (o médico e a cobaia) de forma admirável. E, para dissecar sobre isso, me aprofundarei um pouco mais em alguns fatos importantes. Inicialmente, temos o médico (interpretado muito bem por Antônio Banderas), como uma figura triste e, diga-se de passagem, perigosa que, com seus experimentos nada ortodoxos, deixa o espectador receoso acerca do que ele poderia se tornar no futuro, com o desenvolvimento da plot. Mas, com flashbacks, somos apresentados ao passado do mesmo e lá compreendemos o motivo de todos os seus rancores e mágoas, como a perda de sua esposa devido à um incêndio (o que explica sua obsessão por uma pele artificial) e o suicídio de sua filha, após ter sido estuprada e estapeada por um rapaz drogado. É neste momento que entendemos a persona do médico e transferimos toda a frustração e raiva para o culpado do estupro. Assim, quando o doutor sequestra o rapaz, não conseguimos o julgar, pois ele merece se vingar. Porém, quando ele transforma, através de inúmeras cirurgias, o estuprador em uma mulher, passamos novamente a questionar o caráter do doutor (devido a brutalidade deste ato), mas ainda assim, não conseguimos repreende-lo. E, por fim, quando o culpado (agora transformado em mulher) atira e assassina o responsável por sua transformação física, após seduzi-lo e obter sua confiança, voltamos a sentir desprezo por ela - antiga "ele" - por ter sido tão cruel e calculista. Mas, finalmente, todos os seus pecados são redimidos pela sua ânsia de reencontrar a sua família. Consequentemente, "A Pele que Habito" acaba se tornando um filme onde nenhum dos personagens é completamente culpado, nem completamente inocente. Nós simplesmente somos incapazes de julga-los. 

E as mudanças no estilo almodovariano de filmar não param por aí. A parte técnica também foi repaginada. Agora, vemos uma fotografia mais contida e menos carnavalesca. Uma edição mais simples (porém não menos eficiente) e figurinos menos espalhafatosos. A trilha sonora, elegante e discreta, se funde às imagens de forma excepcional, enquanto o resto da produção não peca por exageros à parte.

Encerrando, para que não me entendam mal, gostaria de salientar que adoro as produções coloridas, alegres e despojadas de Pedro Almodóvar (sempre um ótimo cineasta), porém, acho que o caminho pelo qual o diretor espanhol está se enveredando recentemente ainda pode lhe render ótimos filmes!

Gênero: Drama
Duração: 115 min.
Ano: 2011