(Mediano)
Chan-wook está tentando se "norte-americanizar". Abandonar sua terra e colocar os pés em Hollywood. Felizmente, para o cineasta já consolidado na Coréia do Sul, mudar de ares não significa abandonar suas raízes. Sua abordagem recorrente (sempre ousada e brutal) continua neste seu primeiro exemplar hollywoodiano. Mas, claro, em escala reduzida... até demais.
Mia Wasikowska é India Stoker, uma garota à beira da maioridade descobrindo sua sexualidade e instinto violento, após a morte de seu pai. Regida por uma mãe distante e alienada, Evelyn (Nicole Kidman), se encontra ameaçada pela presença cativante e letal de seu tio, Charlie. Um drama de potencial melodramático, se não fosse levado às telas por Chan-wook Park que, como bom coreano, não hesita em adicionar uma morbidade crescente ao longa. Mas talvez Park tenha se esquecido de que produz, agora, para o comércio hollwoodiano, e que o caráter liberal e extremista de seu cinema anterior não mais pode ser empregado. "Segredos de Sangue" provavelmente é marco zero para um novo cinema do diretor: mais implícito e contido, mais hipócrita. Não pode mais impactar com tramas mirabolantes como na inexorável trilogia da vingança. Tampouco chocar como "Oldboy". Dessa forma, visivelmente as intenções do sul coreano são boicotadas nesta película. "Segredos de Sangue" para sempre na beira do rio, quando o assunto é polêmica. Molha os pés mas não tem coragem de atravessar. O que, inclusive, soa estranho aos habituados a sua cinematografia.
Claro que a culpa não foi de Chan-wook, mas certamente de seus produtores. Agora, se há algo a destacar como demérito do próprio cineasta é sua inabilidade ao explorar seus personagens. Supostamente tentando aprofundar diversas camadas destes, o diretor se revela ineficiente em uma construção mais concisa e verossímil de suas criações. Até porque, pelo menos ao contato que tive com o diretor, não lhe interessa muito o aprofundamento dos mesmos, mas apenas usá-los como objetos para extrair o máximo de emoções do espectador. O problema é que "Segredos de Sangue", como não conta com tantas emoções únicas e chocantes, necessita recorrer não apenas à imagem, mas aos personagens, para se sustentar. E o problema reside aí. A mais complexa talvez seja India, com a profundidade de um pires. Evelyn, então, atinge o cúmulo da má exploração. Mais se assemelha a uma figura esculpida em cera que um ser humano propriamente dito. O próprio personagem do tio, que leva a trama à frente e esconde um segredo, não consegue passar de mais uma alegoria antipática em tela. E o problema é agravado já que os primeiros 30 minutos de filme, até a trama se desenrolar mais um nível, se prende demais e tenta cativar com estes mesmos personagens. O que resulta, então, em uma sequência de cenas, em sua maioria, dispensáveis.
Não obstante, as atuações não colaboram em nada para que o estigma de personagens-bonecos seja quebrado. Kidman está em uma de suas piores performances. Mais fria e inexpressiva, impossível. Matthew Goode (no papel do tio) deveria cativar como conquistador, mas só consegue lançar olhares baratos e escandalosos, o que me faz pensar que Evelyn - que demora bastante para notar que seu amado parceiro não é tão devoto assim - tenha alguma disfunção psicológica. E isso até justificaria a pobreza de sua performance e personagem. Por fim, Mia Wasikowska, a protagonista, soa insossa, porém menos inexpressiva que seus companheiros de cena.
Contudo, em despeito de tantos pontos negativos, principalmente no que tange à submissão de um dos mais prolíferos diretores coreanos aos padrões de Hollywood, há algo que Chan-wook não perdeu e o emprega da melhor forma possível: sua montagem dinâmica, divertida e única. Os flashbacks extremamente bem costurados à trama se unem a uma montagem dialética, enquanto amarrados por uma trilha sonora excepcional do igualmente soberbo Clint Mansell. Há o humor ácido costumeiro e, como sempre, a montagem se torna um personagem independente que, no caso deste filme, soa mais interessante que qualquer outro elemento em tela e é responsável pelo real êxito da produção.
Isto, aliado à uma ótima fotografia, cuida de tornar "Segredos de Sangue" uma obra com cheiro e alma do bom e velho Chan-wook Park, ainda que muito boicotado. E, com isso, a incursão do realizador nos E.U.A pode representar duas coisas: ou a queda de um excelente cineasta, ou um novo sopro de originalidade ao cinema hollywoodiano. Como "Segredos de Sangue" permanece em cima do muro, espero que a segunda opção se concretize.
Gênero: Drama/Suspense
Duração: 98 min.
Ano: 2013
Marcadores:
Críticas
1 comentários:
Será que é bom?
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