334. A Pele que Habito

quarta-feira, 21 de dezembro de 2011
Postado por Selton Dutra Zen


(Muito bom)

Obs: Este texto contém spoilers!

Considero "A Pele que Habito" um filme revolucionário. Não no sentido narrativo, técnico ou imagético, mas com certeza revolucionário dentro da filmografia de seu diretor, Pedro Almodóvar. Digo isto por notar que suas obras, antes cômicas, estão dando lugar à exemplares com um apelo dramático muito maior e histórias mais densas. Basta notar seu longa longa anterior, "Abraços Partidos", que abandona bastante os toques humorísticos e descontraídos, em detrimento de algo bem mais triste, trágico e "pesado" (se é que pode-se adjetivar assim). E isto chega ao ápice em "La Piel que Habito".

A começar pela trama, atípica e um tanto mórbida, que narra um período da vida de um cirurgião doentio e obcecado, ao manter uma cobaia humana presa em um quarto de sua mansão. E, particularmente, eu considero o roteiro deste filme um dos melhores da cerreira de Almodóvar, ao se revelar sério, objetivo e emocionalmente carregado, logo nos primeiros minutos de projeção. Além disso, desconstrói os personagens centrais (o médico e a cobaia) de forma admirável. E, para dissecar sobre isso, me aprofundarei um pouco mais em alguns fatos importantes. Inicialmente, temos o médico (interpretado muito bem por Antônio Banderas), como uma figura triste e, diga-se de passagem, perigosa que, com seus experimentos nada ortodoxos, deixa o espectador receoso acerca do que ele poderia se tornar no futuro, com o desenvolvimento da plot. Mas, com flashbacks, somos apresentados ao passado do mesmo e lá compreendemos o motivo de todos os seus rancores e mágoas, como a perda de sua esposa devido à um incêndio (o que explica sua obsessão por uma pele artificial) e o suicídio de sua filha, após ter sido estuprada e estapeada por um rapaz drogado. É neste momento que entendemos a persona do médico e transferimos toda a frustração e raiva para o culpado do estupro. Assim, quando o doutor sequestra o rapaz, não conseguimos o julgar, pois ele merece se vingar. Porém, quando ele transforma, através de inúmeras cirurgias, o estuprador em uma mulher, passamos novamente a questionar o caráter do doutor (devido a brutalidade deste ato), mas ainda assim, não conseguimos repreende-lo. E, por fim, quando o culpado (agora transformado em mulher) atira e assassina o responsável por sua transformação física, após seduzi-lo e obter sua confiança, voltamos a sentir desprezo por ela - antiga "ele" - por ter sido tão cruel e calculista. Mas, finalmente, todos os seus pecados são redimidos pela sua ânsia de reencontrar a sua família. Consequentemente, "A Pele que Habito" acaba se tornando um filme onde nenhum dos personagens é completamente culpado, nem completamente inocente. Nós simplesmente somos incapazes de julga-los. 

E as mudanças no estilo almodovariano de filmar não param por aí. A parte técnica também foi repaginada. Agora, vemos uma fotografia mais contida e menos carnavalesca. Uma edição mais simples (porém não menos eficiente) e figurinos menos espalhafatosos. A trilha sonora, elegante e discreta, se funde às imagens de forma excepcional, enquanto o resto da produção não peca por exageros à parte.

Encerrando, para que não me entendam mal, gostaria de salientar que adoro as produções coloridas, alegres e despojadas de Pedro Almodóvar (sempre um ótimo cineasta), porém, acho que o caminho pelo qual o diretor espanhol está se enveredando recentemente ainda pode lhe render ótimos filmes!

Gênero: Drama
Duração: 115 min.
Ano: 2011

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